CARTA VAI
Baralhinho do Momento, publicado no site antipropaganda e na revista Void, 2013
(você é novo no Baralhinho do Momento? comece por aqui)
Número: 10
Comentário:
A Carta Vai é uma carta curta, mas de mensagem comprida. Porque quando você vai, você vai. Pode ser tanto pra ali do ladinho, quanto pra puta que o pariu, que é bem mais longe. A Carta VAI tem tantos sentidos e pode ser aplicada de tantas formas, que a gente só vai falar de duas, ou três.
A 1ª é que a Carta VAI é antes de tudo um incentivo, um movimento, um empurrão. Você quer que a pessoa faça, decida, saia da inércia do pensamento e tome a decisão de ir adiante, ou ir pra trás, mas você quer que ela vá! Você quer que o veículo vá, o objeto vá, o gozo váááááá, não importa pra onde, não importa com quem, não importa pra que, importa que vá e vá agora. Vai, meu amor! Vai você que eu tô indo também! E aqui você já vê que não é vamos, nem vou, é vai. Vai você. É o outro e é sozinho. Se ele vai, você fica. Igual truque pra se livrar de mordida de cachorro solto na multidão: tu grita “corre!” e fica parado. E o cachorro vai atrás de quem foi. E em você, que não foi, ele não vai.
Sacou? Vamos mais. A velhota hesitou na beirola do abismo? Vai e vai de cambalhota, velhota! Sem medo. Confia no rolamento. Tua amiga abriu a brecha pra marmota careca sapeca? Vai e volta com a marmota dentro da toca! Quem gosta, gosta. O carcereiro largou aberta a porta? Vai e solta o resto, 1, 2, 3, salve todos! É gol do seu time e a grade pouco firme da arquibancada muito alta cedeu na sua mão? Vai e cai gritando, que a torcida vai atrás esmagando capa de jornal! Depois vai na ambulância. Depois vai na missa. Depois vai na justiça. Depois vai na vingança que a justiça não resolveu.
Porque a Carta VAI é esse mistério. Ela não tem direção, ela não tem destino e ela não tem - ah, neném - ela não tem garantia. Nenhuma! Ela tem o vai! E foi, malandro. Porque com a Carta VAI, você vai. E vai forte! Porque primeiro você vai com a mente, que vai muito mais rápido. Vai muito mais longe. Depois você vai com o corpo, que de repente nem vai. Até porque nem precisa, a mente já foi, já viu, já voltou. Mas tem um problema, ou dilema, ou poema, que é: às vezes a mente vai e não volta. Aí o corpo estremece, as pernas desobedecem e inconscientemente a gente dança. E dança bonito. Porque a mente não tem distância, a mente cria.
E a Carta VAI é isso, esse tranco nas costas na entrada da área do futebol de rua, que você sente o gosto do paralelepípedo pipocar na sua boca. Doce mel. Dente de cristal. Frontside-explode-face de tão forte que vira até nome de manobra radical, tema de seminário, figurinha carimbada, peça de museu. Doeu? Doeu. Mas valeu o gol? Não valeu. Então dói mais.
A carta Vai é assim, sem fim, porque quando você lança, o momento complementa e define. Tu despacha a carta, mas é o momento que bota o endereço. Vai cair é uma coisa, vai subir é outra. Vai chegar é um suspense, vai sair é um alívio. Vai começar pode ser triste, vai terminar pode ser feliz. Vai na fé pode dar azar, vai com Deus pode dar sorte. Sorte de Deus se você for mesmo tão legal assim como parece que não é.
Vai dar, Vai ver, Vai precisar, Vai acontecer, Vai falhar, Vai morrer, Vai nascer, Vai chorar, Vai bater, Vai machucar, Vai ligar, Vai desligar, Vai sofrer, Vai passar, Vai voltar, Vai mudar, Vai mentir, Vai sumir, Vai esquecer, Vai guardar, Vai derreter, Vai molhar, Vai transbordar, Vai escorrer, Vai correr, Vai tropeçar, Vai olhar, Vai aprender, Vai estudar, Vai repetir, Vai gostar, Vai odiar, Vai prometer, Vai repetir e quando ninguém mais achar que você vai aparecer, você vai surgir no meio da sala com uma bomba. Solta a Carta Vai e BUM!
A carta Vai é essa caixinha de surpresa que só vai abrir, quando você lançar. Porque o Baralhinho do Momento não é a resposta pra nada, ele é a luz acesa que ilumina tudo. Concretiza a ação. Vira cimento. Incentiva o movimento. Às vezes as pessoas precisam de muito pouco pra ir e você, que está preparado pra empurrar, empurra. E a pessoa vai, porque vale a carta. Isso é que é o bonito do jogo: vale a carta. E jogou a carta, foi. Não tem como.
Exemplos Ilustrativos de Uso:
E pra fechar abrindo, vou deixar nestes exemplos ilustrativos, uma 2ª proposta embutida na mensagem da Carta VAI que é a de servir como abreviatura de um xingamento mais longo, um destempero mais cruel, uma sinceridade mais nervosa, um vai pra puta que te pariu você e teu pai que te educou como um merda que ele é e você é mais, teu filho de uma puta! Na Carta VAI só vai o vai mesmo, porque o resto você vai expressar no clima. E vai ficar claro, óbvio. Ninguém terá dúvidas de que aquele vai, vai fundo nessa emoção.
Teu computador zero bala, vinte e cinco mil dólares à vista estourou na 220 volts na bobeira do seu pai que trocou a tomada e não sinalizou? VAI, filho da puta!
Você na ponte Rio-Niterói com seu Corsinha duzentos mil quilômetros 5 vezes Niterói-Garopaba, quando enchem sua traseira e a pessoa que você estava levando pra comer em casa, agora está cuspindo vidro do painel? VAI, viado! Falei pra botar o cinto. E agora volta. Volta pro hospital.
Aliás, vale sinalizar que a Carta VOLTA ainda não tem, ok? Existe uma certa incompatibilidade natural da mensagem VOLTA com a dinâmica do Baralhinho do Momento, que exige a observação da carta, mas, pensando bem, porra nenhuma! Vai ter a Carta VOLTA sim! Voltei atrás. Voltarei com mais.
Vai!


Pronto, Canto de Ossanha grudou no meu cérebro.
Alguém já criou um pack de stickers do zap com essas cartas? Se não, eu me disponibilizo